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Análise

Banana Fish é bom? Vale a pena ver o anime? | Crítica

Um belo romance no caótico submundo de Nova York, isso é Banana Fish
19 minutos para leitura

Em 1948, numa edição da The New Yorker, foi publicada uma mini história de J. D. Salinger sobre Seymour Glass, um soldado americano que sofreu com o trauma pós-guerra. Esse conto foi intitulado “A Perfect Day for Banana Fish”. 

Todos sabem (ou deveriam saber) que a vida de um soldado em batalha é barra pesada. Mas pior que a batalha talvez seja o retorno da mesma. Com certeza o pós-guerra mundial foi o um dor piores “retornos”.

A mini história antes citada tratou sobre algo que era comum naquela época: os soldados não conseguiam voltar e se encaixar na sociedade após terem participado do sangrento campo de batalha.

Mesmo que hajam diversas interpretações para a obra de Salinger, acredita-se que o principal ponto que o autor quis abordar foi o retorno dos soldados veteranos de guerra.

Ou seja, como eles ficavam traumatizados e angustiados devido a toda carnificina que presenciaram em seus combates. 

Tendo em vista tais eventos, uma mangaká chamada Akimi Yoshida, em 1974, evidentemente inspirada pela obra antes citada, conquista a serialização de seu mangá intitulado “Banana Fish”, cuja ilustração e história são de autoria dela própria.

Banana Fish novo mangá

Recentemente, aproximadamente duas décadas após lançamento do último volume do material original, em 2018, Banana Fish ganhou uma adaptação animada como cortesia do estúdio MAPPA (mesmo de Ushio to Tora, Kakegurui, Inuyashiki e Dororo).

Brigas entre gangsters e a máfia (com direito até a policiais e o exército intervindo). Traumas de um protagonista com uma vida sofrida. Uma incansável busca por liberdade e vingança.

E estes são somente alguns dos melhores pontos que o anime dirigido por Hiroko Utsumi conseguiu abordar com maestria!

[ESTE REVIEW CONTÉM SPOILERS LEVES]

Uma infância triste até demais em Banana Fish

A história original se passou em Nova York, nos anos 70/80. Porém, o estúdio MAPPA achou melhor fazer a nova adaptação se passar nos dias atuais.

A produtora realizou um trabalho muito satisfatório em trazer a vibe retro presente no mangá para o anime, por meio da utilização uma paleta de cores bem chamativa, designs mais rústicos da cidade e personagens com vestimentas e estilos mais puxados para a “época de ouro” americana.

Ash, nosso protagonista, era um garoto normal, até começar a sofrer abusos sexuais de um ex-militar em sua cidade natal. Como seu querido irmão, Griffin Callenreese, fora convocado para servir o exército na guerra do Iraque, e sem poder recorrer a seus outros familiares, Ash resolve fugir de casa aos seus poucos 8 anos de idade.

Infelizmente, a fuga de Ash resultou apenas em cair nas mãos de “Papa” Dino Golzine, um pervertido chefão da máfia Corsican que reside em Nova York. 

Enquanto em “posse” do chefe mafioso, o pobre garoto sofreu sendo utilizado como brinquedo sexual – e não somente para satisfazer os desejos do chefe mafioso. Papa Dino forçou o garoto a se prostituir à terceiros durante toda sua pré-adolescência e adolescência. 

Todavia, Papa Dino criou certo apego pelo garoto (?) e pretendia fazer do nosso – até então coitadinho – protagonista o seu sucessor um dia. 

Ash e Papa Dino, cara a cara, em Banana Fish
“De cara com o poderoso chefão”

O temível lince de Nova York, Ash

O tempo passa, e após rígidos treinamentos e experiências de vida adquiridas, Ash se torna um temível e frio assassino “quase” profissional. Mesmo assim, ele ainda trabalha para a máfia e se encontra preso nas garras de Papa Dino. 

Durante a série inteira, Ash é constantemente comparado a um lince: uma figura sutil, bela e mortal. Com tal personalidade, seria meio controverso ele viver uma vida submissa a um velho que já lhe causou tanto mal, não?

Pois é. Naturalmente, não demorou muito para nosso protagonista resolver se rebelar contra seu até então “dono”.

A espera para tal rebelião se deu devido ao fato de ele precisar de dinheiro para cuidar de seu irmão Griffin, que agora já havia voltado da guerra para que fora convocado. Griffin Voltou vivo, porém, inapto de viver

O irmão de Ash estava em estado praticamente vegetativo, não reagindo a qualquer coisa que seu irmão mais novo fizesse. Não reagia a exames médicos e nem a medicamentos. Sua consciência não estava mais no corpo. Parecia uma carcaça sem alma. Só uma coisa saía da boca do ex-soldado: “Banana Fish”.

Ash, ao ouvir o termo desconhecido, precisava descobrir o que aquilo significava. Ele já planejava seu primeiro movimento contra Papa Dino de qualquer maneira, mas, ao descobrir o envolvimento de Papa com o tal “Banana Fish”, ele resolve então tomar providências: fazer Papa Dino pagar.

Ash se perguntando o que é Banana Fish
“Banana Fish: o mistério”

Antes de enfrentar Dino: mais problemas

Entretanto, novamente para a infelicidade de nosso protagonista, Ash se depara com um conflito interno em sua gangue. Mal sabia ele que tal conflito desencadearia uma série de eventos que traria tantos problemas, mortes e incertezas para sua vida. 

Ah, eu não comentei? O lince também é um respeitável e intimidador líder de uma das maiores gangues do submundo de Nova York. Tudo isso aos seus 17 anos!

Então é, até agora temos um protagonista adolescente que é praticamente um profissional do assassinato, corajoso à beça e que sofreu muito em sua infância. Já deu para ver que o circo pega fogo em Banana Fish né?

Ash apontando uma arma
“Belo, corajoso e preparado para matar”

Um estorvo necessário chamado Eiji

Apesar da personalidade de ferro de Ash, é evidente que uma pessoa que passou por tudo que ele passou sofra com alguns problemas psicológicos. 

Aí que entra Eiji Okumura, um jovem japonês de 19 anos de idade, ajudante de repórter e atleta de salto com vara (aposentado rs), que estava na hora errada, no lugar errado. 

Logo no primeiro encontro de Ash com Eiji, é possível perceber o interesse que nosso protagonista criou no garoto oriental. 

Passava longe de ser um interesse amoroso no começo. Era apenas um tipo de “felicidade”. Eiji, em toda sua ingenuidade, só queria aprender mais sobre o temível lince de NY. Ele não tinha medo de Ash. O garoto só queria se aproximar, e, quem sabe, cultivar uma amizade.

Para Ash, alguém se aproximando sem exalar respeito, medo ou desejos sexuais era algo novo. Algo, diferente. Talvez emocionante. Sendo assim, Eiji acabou por ser uma figura reconfortante para Ash. Passava a sensação de “lar” que até então nosso protagonista nunca teve. 

Apesar de ser quase um peso morto durante os combates e ser capturado algumas vezes como refém, Eiji é um cara bondoso, com um grande coração. Destemido quando necessário, também. O personagem mostra uma evolução muito legal durante o anime.

Ash ensinando Eiji a Atirar
“Eiji também precisou aprender a se virar”

E o romance?

Vale ressaltar que o diretor do anime, Hiroko Utsumi, dirigiu também Free!, que é um anime de atletas masculinos de natação. O problema de Free! está em ser um anime completamente superlotado de fan service yaoi.

Felizmente, em Banana Fish não foi bem assim (que fique claro que não curto fan-service forçado e exagerado, não tenho nada contra romances homossexuais ok?). 

Em Banana Fish, a relação dos dois protagonistas é muito bonita e puritana. Nada demais acontece. Há sim, indícios de um romance na trama. Porém os inimigos de Ash não deram trégua para que cenas como beijos ou coisas do tipo acontecessem. 

É ação do começo ao fim do anime; com uma pitada de drama em algumas partes. O tempo inteiro tem alguma situação problemática nova para que nossos protagonistas superem. Sendo assim, não há tempo para desenvolver um romance até os finalmentes

Os laços entre Ash e Eiji com toda certeza fizeram com que ambos conseguissem superar de cabeça erguida todos os problemas. 

Ash eventualmente teria seu psicológico destruído ao longo de sua interminável estrada de vingança se não fosse pela ajuda do japonês. Eiji, por sua vez, com certeza teria levado uns tiros se não fosse pelos ensinamentos e a proteção do lince.

Banana Fish é exagerado em alguns pontos?

O único ponto um pouco infeliz neste cenário de romance é que em alguns momentos me pareceu um pouco forçado o apego dos personagens com o protagonista. 

Nada contra homossexuais, reforço. Eu quis dizer que achei uma coincidência forçada que praticamente todos os mandachuvas que querem o lince decapitado, também parecem querer passar uma noite de núpcias com ele. Ficou bem esquisito isso.

Acho que podiam ter pego mais leve nesse ponto. Ficou parecendo um harém colegial em algumas partes com tanta gente querendo passar a mão no Ash. 

Contudo, se você por acaso largou o anime por causa do “romance homossexual abusivo” que algumas páginas na internet estavam pondo em suas manchetes como um click bait sacana, me chama nos comentários, vamos conversar porque não é bem assim. 

Ash com a mão na cabeça de Eiji, em Banana Fish
“Isso é praticamente o máximo de fan service que você vai encontrar em Banana Fish”

Os coadjuvantes de Banana Fish

Além da profundidade que Banana Fish dá ao seu estimável protagonista, é impossível ignorar os outros personagens que participam dos eventos do submundo de NY.

O anime consegue trabalhar muito bem uma quantidade elevada de personagens secundários que, apesar de seus desenvolvimentos serem mais rasos que o de Ash, ainda assim são muito bons. 

Particularmente, eu achei todos carismáticos à sua maneira, pois todos conseguem fazer você entender suas convicções e motivos, tornando possível o entendimento dos dois lados da moeda do crime.

Criminosos contra o crime organizado!

Banana Fish conta com outros dois memoráveis líderes de gangue: Shorter Wong, o cabeça dos chineses que comanda Chinatown e melhor amigo de Ash; e Cain Blood, o líder da “Black Sabbath”, uma gangue americana com descendência africana que controla o Harlem, uma vizinhança de NY. 

Ambos os personagens foram muito bem trabalhados. Se existe uma característica chave para descreve-los, seria sem dúvidas a lealdade.

Não somente as gangues de rua tiveram relevância em Banana Fish. A trama toma proporções maiores à medida que a história se desenvolve.

O crime organizado teve papel fundamental na história. Existe a máfia Chinesa, liderada pelos irmãos Lee, que detém posse de grande parte do território estadunidense. É dona até mesmo de uma rede de bancos. 

E ainda existe a máfia Corsican, que tem Papa Dino (sim, o velho safado la do começo) como chefão e tem conexões com altos escalões do governo dos Estados Unidos e com representantes mundiais. O principal objetivo da máfia é conseguir executar o projeto “Banana Fish” com sucesso.

Ao longo de sua jornada, Ash conseguiu com que algumas mãos inesperadas o ajudassem. O carisma do lince conquistava quase todos a sua volta (até demais as vezes rs).

Outros personagens que marcaram presença na jornada foram os fiéis companheiros repórteres, Max Lobo, o americano, e Shunichi Ibe, o repórter japonês que trouxe Eiji aos EUA.

Ora forçado, ora sério

Eu tenho um grande inimigo de animes/séries/filmes, e ele se chama “combate com armas de fogo”. Ou melhor, “combate surreal com armas de fogo”. 

Sabe aquelas cenas de Star Wars onde os clones estão atirando lasers com suas armas de última geração, mas nenhum único tiro atinge um alvo sequer? 

Ou em cenas de batalha como as de Rambo, onde o personagem é tão fodalhão que ele não erra nada? 

Ainda, em Cavaleiros do Zodíaco, quando os cavaleiros apanham pra cacete, mas mesmo assim se levantam o tempo inteiro para lutar contra novos inimigos, sem um descanso adequado? 

As batalhas de multidões em Banana Fish seriam uma soma dos três exemplos citados acima. 

Talvez seja porque o anime não consegue deixar claro (talvez propositalmente) quanto tempo está se passando entre um acontecimento relevante e outro. 

Tem uma hora que o Ash se encontra armado somente com seu revolver e com um possível resto de munição que ele teria nos bolsos. Mesmo assim ele consegue derrubar sei lá, uns 20 gangsters armados enquanto estava cercado, dentro de um trem em movimento. 

Não me entenda mal, eu adorei a ação e as outras cenas de batalha que tinham menos participantes. Os combates são intensos e você não consegue saber quem vai vencer até ver o final da batalha. 

Quanto à parte técnica

As cenas de ação são muito bem animadas. Na verdade, o anime inteiro é bonito. Os animadores capricharam, conseguindo melhorar o traço do material original e ainda manter o estilo anos 80.

Material Original de Banana Fish
Banana Fish do Mappa, Ash e Eiji encurralados
“Ficou muito fiel ao material original”

Por sua vez, a trilha sonora ora é eletrizante, ora é calma e serena. Também é sombria e cruel quando necessária. O tema do Papa Dino é simplesmente magnífico, apesar dele ser um filho da puta. Eu amei as aberturas e encerramentos da série também. Ouço até hoje. 

Finalizando…

Banana Fish é um anime com uma temática pesadíssima. Não é uma história cheia de plot-twists, mas com certeza é uma história única. Temas como abuso sexual, violência e tráfico são abordados constantemente durante o anime.

Em suma, o anime todo trata sobre contar a história do protagonista: Ash Lynx. A adaptação aprofundou o carismático personagem principal a ponto de você mesmo querer entrar na tela e lutar por ele.

Além disso, desenvolveu os personagens secundários o suficiente para você entender como eles afetaram direta ou indiretamente a vida do poderoso lince de NY.  

E eu tenho certeza que você já engoliu cenas de batalha de multidão muito mais duvidosas em diversos animes/séries/filmes.

Então, mesmo que você tenha considerado algum combate em Banana Fish surreal, não são irrealistas a ponto de estragar sua experiência com a incrível adaptação que o estúdio MAPPA nos entregou na segunda metade de 2018. 

O mesmo vale para o romance. Na boa, apesar de uma das fortes motivações do Ash sobreviver seja “proteger e salvar o Eiji”. Além disso, o anime não nos traz em momento algum qualquer tipo de cena de romance meloso, do tipo “mãozinhas dadas”. 

Qualquer tipo de romance forçado, homossexual ou não, teria estragado a essência da série.

Vale ressaltar que a Akimi Yoshida foi uma das autoras precurssoras de conteúdos que envolvem relações amorosas entre personagens do mesmo sexo. Ela foi foda porque naquela época foi algo bem ousado de se fazer, ainda mais na machista sociedade japonesa. Admiro ela. 

O anime me conquistou em todos os aspectos. A animação, os personagens, a história, a trilha sonora, a ambientação, o background, os vilões… No fim, tudo me marcou positivamente.

Concluindo, minha nota final não teria como ser diferente de um…

Nota
9.2

/10

Peço perdão pelo super-review-estendido, mas é que para mim é inevitável escrever bastante sobre algo que eu gosto de verdade. Mas e você, gostou tanto quanto eu?

EXTRAS

Blanca, de Banana Fish
“Aquele personagem que faz você pensar: eu respeito esse cara”
Os chineses de Banana Fish
“Outros dois chineses que deixaram sua marca no anime”

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Escrito por

André Uggioni

Co-Fundador

Host do CúpulaCast

Criciúma - SC

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