Mais uma vez, trago aqui uma review sobre outra obra de Inio Asao, meu mangaká favorito. Mas para os que tiveram a oportunidade de ler a crítica sobre Solanin, já sabem desta informação. Mas caso não tenha lido, aproveite e leia. Dessa vez comentaremos acerca do mangá Nijigahara Holograph.
Para poder escrever este texto, tive que dar uma segunda lida na história, afinal estamos falando de Inio Asano. O autor ama trabalhar com temas reais e bastante profundos sobre a vida e também o propósito da existência do ser humano. Sendo assim, logo de início, é importante salientar o estilo de narrativa encontrado em suas obras.
Quem conhece Boa Noite Punpun, sabe o quão pesado pode ser uma história de Asano. Abordando sobre questões existenciais, ansiedade, depressão e afins, acaba tornando-se uma leitura um tanto pesada e que instiga sentimento ruins em alguns. Da mesma forma, aqui em Nijigahara Holograph não é diferente.
Enfim, com isto em mente, prossiga o texto. Aliás, antes de dissertamos de fato sobre o enredo de Nijigahara Holograph, assista o vídeo abaixo e conheça outras obras o autor, caso tenham chamado a tua atenção e queira conhecer um pouco mais do trabalho de Inio Asano.
- Gênero: Drama , Psicológico
- Revista: Quick Japan
- Volumes: 1 (one-shot)
- Autor: Inio Asano
- Publicação: 12 de novembro de 2003 a 10 de dezembro de 2005
Introdução à Nijigahara Holograph
“Acho que não vou conseguir fazer outra obra como esta.” – Inio Asano.
Esta é uma afirmação presente na contracapa do mangá. Será que é necessária muita argumentação para provar que Nijigahara Holograph é uma obra de arte? O próprio autor reconheceu o valor de seu trabalho como “único”.
Talvez, só talvez, deve-se dar uma chance para o título apenas por este comentário de Asano. Desvendar os mistérios do que compõe essa narrativa que levou o mangaká a se expressar desta forma.
Explicando a grosso modo, Nijigahara é um campo aberto adjacente ao prédio da escola onde boa parte da história é narrada. Seria algo como “holograma do arco íris”. Além do mais, também existe uma outra tradução para a área.
Nesta segunda versão, seria algo “duas crianças”. Existia uma lenda urbana relacionada com essa tradução. A história dizia que o cadáver de um determinado demônio era despejado no rio, surgia, então, duas crianças demônio.
Aliás, um ponto interessante acerca desta lenda é o fato de ser taxada como lenda na história, mas ter pequenas referências na vida real. Às vezes até interferindo no modo de viver dos personagens.
Por fim, toda história está conectada à Nijigahara. O presente, o passado e o futuro são elementos bastante utilizados por Asano neste plot surpreendentemente avassalador e inquietante.
Sobretudo, esse eventos temporais são transportados dentro dentro da narrativa sem o mínimo de aviso, tornando tudo um pouco confuso. E, claro, há ligações entre todos eles. Unindo personagens e, acima de tudo, explicando fatos.
Além de tudo, Nijigahara Holograph é um mangá sobre entrelaçamento de vidas. Sobre destino, aceitação, arrependimentos e também, sobre superar o passado e olhar para o futuro. Em suma, aqui não abordarei sobre questões profundas do mangá, evitando dar spoilers e estragar a experiência de leitura.
O quão pesado Nijigahara Holograph pode ser?
Assim como Kentaro Miura tentou denotar os traços mais perversos da humanidade em seu mangá Berserk, Inio Asano também consegue apresentar este feito em sua obra. Em muitos momentos, sendo os mais tênues, nos deparamos bastante com frases dos pais para seus filhos da seguinte forma: “vê se trata de morrer rápido, você não é amado”.
Subsequentemente, temos o famoso “é brincadeirinha”. Como já dizia o velho ditado: em toda brincadeira há um pouco de verdade. E isto evidencia o peso que os pais sentiam de ter que carregar os próprios problemas e também os dos filhos. Ou mesmo, no caso de uma personagem em específico, ter que suportar o filho de um outro casamento.
Ademais, há momentos que mostram o total descaso humano para com o sentimento do próximo, ou mesmo atos de violação, abusos e por aí vai. Tudo isto agrega ainda mais para a visão de que o mundo é um lugar ruim. E para contrastar com esta afirmação, existe uma frase que diz que o mundo não é um lugar ruim, as pessoas que o torna. Dessa forma, aquela sensação ruim se torna cada vez mais presente conformo a leitura vai se desenvolvendo.
Entretanto, é importante avaliarmos o fato de que esses pontos estarem presentes em uma história de ficção, por assim dizer, não significa que não são reais. E esta análise é crucial, pois entendemos que o autor está mostrando o que realmente acontece no mundo real e o quão nocivo o ser humano pode ser.
O uso do cinismo para viver a vida
Um dos personagens principais, porque são vários, e vamos comentar sobre isso mais para frente, é o Suzuki Amahiko. Boa parte da história é narrada por ele e vemos a vida por meio de sua perspectiva.
É a partir dele que notamos algo que praticamente todos fazem ou já fizeram em algum momento da vida. Viver por meio do cinismo, da indiferença acerca de coisas ou pessoas, parece facilitar o convício.
Por mais que pareça ser uma atitude arrogante, inapropriada ou, quem sabe, infeliz de se viver, ele, por sua vez, alivia muitas emoções e evita diversas frustrações.
O fato ocorre quando Suzuki é transferido de sua escola em Tokyo, para a escola atual. Em sua antiga escola Suzuki sofria bullying e quase morreu quando tentou cometer suicídio.
A percepção de vida que o garoto tinha não era das melhores. Quando, enfim, começou uma vida nova, as coisas pareciam não ser diferentes. E ele logo percebeu isso.
Porém, diferente da outra vida, seguindo conselho de sua professora, ele apenas decidiu viver de uma forma que não levasse nada em consideração.
Apenas seguisse o fluxo das coisas. Mais para frente, isto parece se tornar um estilo de vida. Quanto menos interação você tiver, quando menos se envolver com pessoas ou mesmo tentar resolver problemas, menos problemas você trará para si.
Contudo, é uma faca de dois gumes. Por um lado, benéfica, por outro, te torna uma pessoa amargurada e solitária.
A beleza ofuscada pela tristeza do coração
A falta de amor próprio ou os baques da vida resultando na falta da compreensão de que a pessoa merece mais também é abordado de forma sutil por Inio Asano.
É o caso de Maki Arakawa. Há um determinado momento na história onde somos apresentados a ela tentando desenhar um quadro, mas seu professor diz que ela precisa expressar algo com emoção.
Esta é uma tarefa árdua para Maki devido seu passado. Logo a garoto desiste de tentar produzir algo com base em suas fortes emoções, porque afinal de contas, ela não possui capacidade para tal, segundo ela.
Quando, então, temos uma cena maravilhosamente ilustrada, onde está acontecendo o “surto das borboletas”, uma pessoa sugere que ela poderia desenhar aquele momento. Porém ela diz não ser possível, porque é lindo demais.
As borboletas em Nijigahara Holograph
Um dos pontos focais da história: as borboletas. Mas afinal, o que elas significam. De fato um elemento misterioso utilizado por Asano. E aqui é mais como um simbolismo para algo. É possível que tenha relação com o famoso efeito borboleta, mostrando que as atitudes de cada um nos eventos paralelos mudam a trajetória de suas vidas.
Também, há a possibilidade de, talvez, ser uma espécie de alguma entidade guiando os personagens para a salvação/redenção. Existem muitas respostas para esta pergunta. E pode-se dizer que são subjetivas. Sobretudo, a presença destas borboletas está ligada intrinsecamente a um fato importante da história.
Narrativa ensemble cast
Ensemble cast é um termo em inglês que designa um elenco formado por vários personagens principais. Todos eles possuem, aproximadamente, a mesma importância e tempo de tela.
Em Nijigahara Holograph, Inio Asano trabalha desta forma. Esta não é a primeira vez que o autor desenvolve sua produção utilizando este método. Também vemos isto em A Cidade Da Luz e em seu trabalho recém publicado aqui no Brasil, What a Wonderful World. A propósito, caso queira saber do que se trata este mangá, assista ao vídeo abaixo.
Esse estilo de narrativa pode ser bom e ruim ao mesmo tempo, uma vez que pode se tornar confuso acompanhar todos os desdobramentos. Ainda mais quando há uma conexão em tudo o que está acontecendo.
Por fim, outro mangá que trabalha com esse formato ensemble cast e é simplesmente maravilhoso, é Bokurano. Aliás, escrevi uma crítica sobre Bokurano. Caso queira saber um pouco mais sobre a história, dê uma lida. Vale a pena.
Finalizando a crítica de Nijigahara Holograph
Em resumo, leia esta obra. Com certeza ela vale muito a pena. Porém, todavia, entretanto, como supracitado na introdução, pode ser que ele não seja um mangá para todos. Além do mais, com certeza é um mangá com um conceito que foge bastante do mainstream.
Reiterando, estamos falando de Inio Asano. Não é para todos. Seus temas provocam fortes sentimentos e reflexões acerca da existência. E como sempre digo, o ato de falar, por meio do mangá, sobre questões da vida e sentimentos dos mais variados possíveis, torna a experiência mais tangível e real.
Por fim, é importante salientar acerca do desfecho da obra. Tendo em vista que muitos aderem um final mais fechado e sem pontas soltas, Nijigahara Holograph, assim como muitos outros trabalhos de Asano, não possui um final objetivo. Isto porque geralmente sempre são subjetivos, dando margem ao leitor entender como bem quiser.
Por mais que isto desagrade alguns, é o modo como Asano desenvolve suas histórias. Final feliz, triste, solucionado, sem solução, enfim. Tudo depende bastante da concepção de quem está lendo e em como interpretou o todo.
Contudo, novamente, leia este mangá de Inio Asano. Garanto que será uma experiência, no mínimo, inesquecível.