Uma Advogada Extraordinária (Extraordinary Attorney Woo) é um dorama. E, apesar de doramas não serem muito comuns por aqui, já tivemos alguns.
Afinal, os doramas também são mídias orientais asiáticas importantíssimas, que têm ganhado espaço nos últimos anos, com a ascensão do k-pop em terras ocidentais.
Para a Cúpula, falar sobre dorama não é tão comum – porque a maioria de nós escreve sobre animes e mangás. Eu mesma, sempre escrevi sobre os dois. Então, Uma Advogada Extraordinária é o meu primeiro dorama! E tenho que dizer: fiquei muito impressionada. Positivamente impressionada.
Não há necessidade de spoilers aqui, apesar de eu achar que nenhum spoiler estragaria a experiência do dorama como um todo. Na verdade, esse texto será muito pessoal, porque atinge diversos pontos importantes para a minha vida.
Antes de escrever esse texto aqui, tentei fazer outro que desprezei. Já faz muito tempo que não vejo algo que me toque profundamente, o que tornou difícil fazer alguma análise apaixonada ou profundamente indignada. Essa será a primeira das duas.
- Gênero: Drama; Jurídico
- Estúdio: Genie
- Roteiro: Moon Ji-Won
- Episódios: 16 episódios
- Ano de lançamento: 2022
Woo Young-Woo não é uma advogada normal
Claro, o título já diz isso. Woo é uma advogada extraordinária, não só porque tem uma capacidade de análise fora do comum, mas também porque tem Transtorno do Espectro Autista. Ou seja, é uma pessoa com deficiência.
Apesar de sua deficiência, Woo se forma com honras na Universidade de Direito de Seul, e se lembra com memória fotográfica de tudo o que já leu (todas as leis coreanas existentes). Ela também é hiperfixada em baleias, o que é super fofinho.
Apesar de uma infância difícil, em que foi criada somente pelo pai, Woo superou suas dificuldades e seguiu em frente. Agora, com 27 anos, foi contratada por um enorme escritório de advocacia, a Hanbada, e terá que enfrentar enormes desafios do ponto de vista jurídico.
Em primeiro plano, cabe falar que é impressionante sobre como a personagem não é reduzida à sua deficiência. É claro, isso faz parte dela, mas não é o único motor da história.
Isso me lembra muito a forma sobre como o Bojji, de Ousama Ranking, é desenvolvido. Ele é surdo, e isso impacta em sua história, mas ele não é reduzido à sua deficiência. Ele tem sonhos, aspirações e tristezas que ultrapassam a sua deficiência.
Ou seja, para a construção de um bom personagem, temos que considerar uma multidimensionalidade de fatores, para garantir verossimilhança. Uma Advogada Extraordinária faz isso muito bem.
Woo vive outros fatores: dilemas românticos, dilemas familiares e dilemas morais, todos de uma forma muito natural e real.
Uma Advogada Extraordinária e os dilemas da advocacia
Há algum tempo, trabalhei em um escritório de advocacia como estagiária. Para aqueles que não sabem, faço Bacharelado em Direito desde 2018.2, e estou na porta da faculdade, quase metendo o pé.
Uma informação importante é a de que, quando estagiamos, podemos escolher nossa área de atuação. Podemos estagiar na promotoria (acusação), na defensoria (defesa pública) ou até mesmo na advocacia (defesa privada).
Por sorte, um amigo advogado me chamou para trabalhar com ele, e isso fez uma diferença significativa na minha vida. Eu vi e estudei casos importantes, e me deparei com situações também desconfortáveis.
Muitas vezes, enquanto advogados ou defensores, podemos realizar a defesa de pessoas com as quais não concordamos (moralmente falando). É o que dá origem à famosa expressão “advogado do diabo”.
Mas, conhecida entre meus amigos como uma pessoa “certinha”, eu sempre tive dificuldade não só de preparar as petições, mas de me sentir disposta a defender pessoas com as quais discordava.
Young-Woo, na sua vida jurídica, sente exatamente a mesma coisa. Ao ver clientes e testemunhas mentindo ou situações flagrantemente injustas, sente um desconforto que não sai tão facilmente. E a resposta dada a ela foi a mesma que me deram – um advogado defende o seu cliente.
É fácil de entender essa máxima, partindo do ponto de vista de que todo cliente precisa de uma defesa. Contudo, o embate moral dentro de pessoas como eu (ou como a doutora Woo) tornam muito mais penoso um trabalho que, para outras pessoas, é muito mais fácil.
Por isso, Uma Advogada Extraordinária bateu fundo. Como aquele momento em que você finalmente se sente compreendido, e que você vê outras pessoas passando pelos exatos problemas pelos quais você também passou.
Uma Advogada Extraordinária te leva em uma dança leve e dramática
Em algum momento, eu senti que não serviria para a advocacia. Woo também. Em algum momento, senti que deveria fazer algo que não fosse o Direito. A Woo também. Meu coração foi imediatamente fisgado, por sentir e passar pelas mesmas situações.
Dessa forma, o roteiro vai te conduzindo, gentilmente, a situações terríveis, como uma dança da vida real. É leve, mas, ao mesmo tempo, intenso. É, de fato, como vivenciar determinadas situações do cotidiano, em que você por vezes não consegue enxergar a gravidade.
E, no meio disso tudo, entra o seu espectro autista. Em um episódio no qual apresentam outro personagem também diagnosticado com TEA, deixam muito claro que o autismo é, de fato, um espectro (que não varia apenas do “mais leve” para o “mais forte”), que pode possuir várias manifestações.
A diferença entre as pessoas desse espectro podem ser muitas, e a Woo é apenas um indivíduo de uma pluralidade de indivíduos autistas. Isso demonstra não só a sua singularidade, mas indica que, diferentemente dela, há outras pessoas que não podem trabalhar como ela faz.
E, ainda assim, ela passa por momentos em que é desacreditada, ou maltratada por colegas de trabalho e por clientes, mesmo sendo um gênio.
Entretanto, ela também aprende sobre se relacionar com as pessoas, e ganha amigos importantes, e a confiança e respeito de seu chefe, que passa a ser para ela um guia profissional e líder.
Ou seja, o roteiro demonstra suas forças e suas inseguranças, por meio de casos de homicídio, agressão, roubo, entre outros, que são brilhantemente solucionados e impactam em muito a sua vida. E, claro, sempre tem um romancezinho para contrabalancear o drama.
Finalizando a crítica de Uma Advogada Extraordinária
Uma Advogada Extraordinária é um dorama adulto, leve e cheio de emoções. Também já disse, mais de uma vez, que não há nada mais importante do que a mensagem de ser você mesmo. Young-woo não só me passou essa mensagem como também me ensinou.
Fiquei, ao final, pensando um longo tempo sobre a profissional que quero ser. Quero ser alguém como a Young-woo, que pretende manter a sua régua moral e que anseia por justiça.
Por muito tempo, eu não falei isso para quase ninguém, porque sempre dizem ser “coisa de calouro”. Mas estou aqui, prestes a terminar a faculdade, e me vejo constantemente incomodada na busca pela verdade e pela justiça.
Em situações episódicas e em casos importantes, o roteiro é extremamente constante, bem desenvolvido e de alta acurácia jurídica. É muito interessante ver como cada caso é desenvolvido e como todos se ligam para formar a personalidade da nossa jovem advogada.
Os demais personagens também são incríveis, e tudo se desenvolve em uma escala cinzenta – um personagem bom pode não ser tão bom assim (como na realidade).
Uma Advogada Extraordinária possui um olhar extremamente interno e muito certeiro sobre a prática jurídica e sobre relacionamentos, um que eu nunca tinha visto antes.
É, sem dúvidas, uma ótima opção para você, ainda que não tenha visto nenhum dorama, como eu. Você vai gostar, principalmente se for advogado(a) ou se pretende um dia ser! Veja, e depois volte aqui para me contar o que achou.